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terça-feira, 20 de março de 2012

NUVEM MANSA


Minúscula, branca,
leve, sem rumor,
bóia no azul uma nuvem:
volve teus olhos e sente
como em seu alvo frescor te conduz
feliz por entre sonhos azuis.


Hermann Hesse
In: Andares

AZUL – TARDE


Ó pura, maravilhosa visão
- quando entre púrpura e ouro,
grave e propício, vais baixando em paz,
resplandecente azul do céu da tarde!


Lembras um mar azul onde a fortuna
com a âncora se encerra
num bendito repouso. Cai do remo
a última gota de mágoa da terra.



Hermann Hesse
In: Andares

CHEIRO DE OUTONO


Mais uma vez é um verão que nos abandona,
agonizando num temporal atrasado:
tranquila a chuva rumoreja, enquanto um cheiro
amargo e tímido vem do bosque molhado.

Na relva pálida a liliácea se retesa
em meio a grande profusão de cogumelos;
tem-se a impressão de que se esconde e se retrai
o nosso vale, ontem ainda imenso e belo.

Retrai-se e cheira a timidez e a amargura
o mundo, com toda a claridade perdida:
prontos, olhamos o temporal atrasado,
pois acabou-se o sonho de verão da vida!

Hermann Hesse
In Andares
tela de Dmitry Spiros

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

RAMO EM FLOR



Para cá e para lá
sempre se inclina ao vento o ramo em flor,
para cima e para baixo
sempre meu coração vai feito uma criança
entre claros e nebulosos dias,
entre ambições e renúncias.
Até que as flores se espalham
e o ramo se enche de frutos,
até que o coração farto de infância
alcança a paz
e confessa: de muito agrado e não perdida
foi a inquieta jogada da vida.



Hermann Hesse
In: Andares

DE PASSAGEM



Não fiques triste: já vem vindo a noite
quando veremos sobre a terra esbranquiçada
a Lua fria, como que a rir-se por dentro,
e então descansaremos de mãos dadas.


Não fiques triste: já vem vindo o tempo
quando teremos sossego. Nossas cruzinhas estão
erguidas juntas na margem clara da vida,
chove e neva,
e os ventos vem e vão.



Hermann Hesse
In: Andares

sábado, 10 de outubro de 2009

ENTRADA DE PRIMAVERA



O vento quente zune toda noite,
pesadamente rufla a sua asa molhada.
Aves pernaltas titubeiam no ar.
Nada mais dorme:
toda a terra está acordada,
a primavera chama.


Fica quieto, coração, fica quieto!
Mesmo que densa e íntima no sangue
agite-se a paixão
e caminhos antigos te seduzam:
de volta à juventude jamais te levarão.



Hermann Hesse
In: Andares
Tradução: Geir Campos

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Passeio à noite



Bem tarde passeio pela empoeirada rua,
A sombra dos muros já se alongam,
Por entre videiras vejo a lua
caindo sobre o riacho e o caminho.


Canções, outrora entoadas,
Baixinho tento afinar,
Inúmeras caminhadas
Sombras a me encruzilhar.


Vento e neve, calor do sol
Tantos anos me recordam,
Noite de verão, raio azul
Na viagem desventura e tormenta.


Bronzeado e possuído
Pela imensidão desse mundo
Sinto-me ainda atraído
Até meu caminho cair no escuro.



Hermann Hesse
In: Caminhada

sábado, 19 de setembro de 2009

Chuva


(Imagem de Steve Johnston)


Chuva morna, chuva de verão
Borbulha de arvores e arbustos.
Oh! Como é bom e cheio de benção
Uma vez mais sonhar de verdade!


Quanto tempo fiquei aqui fora,
Quão estranha essa sensação:
Habitar a própria alma,
O estranho, sem atração.


Nada quero, nada peço.
Baixinho cantarolo sons de criança,
E, surpreso, chego ao berço
Dos sonhos quentes de folgança.


Coração, como estás machucado
Porem feliz, remexendo cegamente,
Nada pensar, nada saber,
Respirar e sentir, somente.



Hermann Hesse
In: Caminhada

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

LINGUAGEM


(Photo by Philippe Sainte-Laudy)


O sol nos fala com luz; com cor
e com perfume nos fala a flor;
com nuvens, chuva e neve nos fala
o ar. Há no sacrário do mundo
um incontido afã de romper
com a mudez das coisas e expor
em gesto e som, em palavra e cor,
todo o mistério que envolve o ser.
A clara fonte das artes flui
para a palavra, a revelação;
para o mental flui o mundo, e aclara
em lábio humano um saber eterno.
Pela linguagem a vida anseia:
em verbo, cifra, cor, linha som,
conjura-se a nossa aspiração
e um alto trono aos sentidos ergue.
Como na flor o vermelho e o azul,
na palavra do poeta volta-se
para dentro a obra de criação,
sempre a iniciar-se e e acabar jamais.
Onde palavra e som se combinam,
e soa o canto, a arte se revela,
e cada cântico e cada livro,
cada imagem, é uma descoberta
- uma milésima tentativa
de cumprimento da vida una
A penetrar nessa vida una
vos chama a música, a poesia:
para entender a criação vária,
já e bastante um olhar no espelho.
O que confuso antes´parecia,
é claro e simples na poesia:
a nuvem chove, a flor ri, o mudo
fala - o mundo faz sentido em tudo.

Hermann Hesse
In Andares