quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Elegia



Colham-se as rosas na manhã da vida;
Ao menos no fugir da primavera,
Das flores os perfumes se respirem.
O peito se franqueie aos castos gozos;
Amemos sem medida, ó cara amante!

Quando o nauta, no meio da tormenta,
Vê o frágil baixel quase afundir-se,
Às praias que deixou dirige as vistas,
E tarde chora a paz que ali gozava.
Ah! quanto dera por volver o triste
Aos amigos da aldeia, ao lar paterno,
E de novo passar junto à que adora
Dias talvez sem glória, mas tranqüilos!

Assim um velho, curvo ao pêso d'anos,
Da mocidade, em vão, os tempos chora;
Diz: "Volvei-me essas horas profanadas
De que eu, ó céus, não soube aproveitar-me".
Só lhe responde a morte; os céus são surdos
E inflexíveis o arrojam ao sepulcro,
Não consentindo que se abaixe ao menos,
A apanhar essas flores desprezadas.

Amemos, vida minha!
E riamos do afã que os homens levam
Atrás de um fumo vão que lhes consome
Metade da existência, esperdiçada
Em sonhos e quimeras.

Não invejemos seu orgulho estéril;
Deixemos à ambição os seus castelos;
Mas nós, da hora incertos,
Tratemos de esgotar da vida a taça,
Enquanto as mãos a empunham.

Quer os louros nos cinjam,
E, nos fastos sangrentos de Belona,
Nosso nome se inscreva em bronze e mármore;
Quer da singela flor que as belas colhem
Se entrance a humilde c'roa,
Vamos todos saltar na mesma praia.

De que val, no momento do naufrágio,
Em pomposo galeão ir navegando,
Ou num batel ligeiro,
Solitário viajante,
Ter só junto da margem bordejando?


Alphonse de Lamartine
Tradução de Castro Alves
(1790 - 1869, França)

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